terça-feira, 9 de junho de 2009

A Viagem do Elefante - José Saramago

O elefante Salomão, renomeado Solimão por quem pôde fazê-lo, veio da Índia para Lisboa e cá esteve mais de dois anos. Não sabemos porque veio. Esteve em Belém e, depois de ter sido alvo de todas as atenções, foi perdendo a aura que a novidade empresta e que durante algum tempo lhe trouxe frequentes e até ilustres visitas.
Quando o rei D. João III de Portugal resolve oferecer o elefante a seu primo, o arquiduque Maximiliano da Áustria, genro do imperador Carlos V, resolve dois problemas de uma assentada: encontrar um presente de excepção à altura do presenteado e dar um destino ao elefante.
Vai encontrar o elefante e o seu cornaca Subhro, que veio a ser Fritz, no cercado em que ambos moravam em Belém, exibindo triste condição, denunciadora do esquecimento que foi caindo sobre eles, e longe da imagem de dignidade exigida a um presente para as excelsas figuras do arquiduque e sua esposa.
É posta imediatamente em marcha uma operação de asseio e, conhecida a aceitação do presente por parte do presenteado, o rei faz constituir, sem mais demoras, uma extensa comitiva para prover às necessidades de Salomão durante a viagem e às exigências diplomáticas da missão.
A comitiva põe-se em marcha em direcção à fronteira espanhola em Castelo Rodrigo, onde se encontrarão com o exército austríaco. Após alguma tensão entre os dois exércitos quanto à entrega do presente, Salomão acaba por sair dali sob a responsabilidade duma comitiva mista, portuguesa e austríaca, em direcção a Valladolid, de onde, pouco depois, prosseguirá viagem para Viena de Áustria, já na companhia dos seus novos donos.
O elefante morreu quase dois anos depois de ter chegado a Viena de Áustria, outra vez Inverno, no último mês de mil quinhentos e cinquenta e três. A causa da morte não chegou a ser conhecida, ainda não era tempo de análises ao sangue, radiografias do tórax, endoscopias, ressonâncias magnéticas e outras observações que hoje são o pão de cada dia para os humanos, não tanto para animais, que simplesmente morrem sem uma enfermeira que lhes ponha a mão na testa.
Além de o terem esfolado, a Salomão cortaram-lhe as patas dianteiras para que, depois de todos os tratamentos, servissem de recipientes à entrada do palácio, para depositar bengalas, os bastões, os guarda-chuvas e as sombrinhas de Verão.
Os sucessos da viagem e as personagens que surgem no caminho, as dificuldades enfrentadas pelo elefante e pela comitiva por essa Europa acima em direcção à Áustria, por caminhos de terra e de mar, são uma metáfora da vida e da humanidade.

Andreia Tomás

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