segunda-feira, 15 de junho de 2009

Maria Adelaide Coelho da Cunha: Doida Não e Não! - Manuela Gonzaga

Todos consideravam o casamento de Maria Adelaide e Alfredo da Cunha exemplar… Ambos tinham uma boa vida: ela era a herdeira do Diário de Noticias, iam a eventos sociais, teatros, faziam várias festas no palácio de São Vicente, (sua casa), e vestia-se sempre muito bem. Mas, quanto ao casamento, não era exemplar, tal como toda a gente pensava, pois o marido passava semanas e meses sem lhe falar e, até pelo que ela sabia, ele já a tinha traído quatro vezes!

Maria Adelaide tinha 48 anos, era baixa, pouco mais que um metro e meio de altura, de corpo franzino e rosto formoso. Tinha um filho de Alfredo da Cunha, José Eduardo Coelho, 26 anos, licenciado em direito por Coimbra.

Com o passar do tempo, Maria Adelaide ficava mais vezes fechada em casa. Só se correspondia por carta com os verdadeiros amigos, dizendo:" estou completamente afastada de tudo e só assim me sinto bem..",pois a sua vida social já não tinha mais interesse. Esta já considerava a vida um suplício, pelo que refere:" a verdadeira felicidade só a morte confere, dando-nos a tranquilidade que a vida nos nega".

Pensava-se que ela andava assim, devido ao facto de estar preocupada com a possível ida do seu filho para a guerra, mas como ele não foi chamado, os médicos alienistas disseram que era devido à menopausa… Mas tudo isto eram apenas suposições, porque o verdadeiro motivo era Manuel Claro, o seu verdadeiro amor e seu chauffer. Manuel Claro era um homem alto, de cabelo negro, levemente ondulado, boca cheia, nariz bem desenhado, modos gentis e correcto com todos.

Por tudo isto, no dia 13 de Novembro de 1918, Maria Adelaide foge de casa para ir ao encontro do seu amado, em Santa Comba Dão.

O desaparecimento de Maria Adelaide causou grande agitação, pois todos pensavam que ela estava morta.

Maria Adelaide abandona uma vida luxuosa e cosmopolita e foge com o motorista de 26 anos. Troca, assim, um magnífico palácio - São Vicente - por um primeiro andar alugado em Santa Comba Dão. Peles, sedas, cetins, jóias por uma saia de chita coberta com um avental grande. Esta manda uma carta ao marido, (conhecida como a carta do lacre verde), para lhe dizer que estava bem e para não a procurar.

Foi a partir desta carta que a encontraram. O seu marido e o seu filho internaram-na no Conde de Ferreira, onde foi posta no pavilhão das criminosas.

Tinha uma empregada só para si e através dela mandava cartas para Manuel Claro. Nunca assinava com o seu nome, pois podia ser descoberta. Com o passar do tempo, foi conhecendo outras pessoas, "companheiras de infortúnio" que, tal como ela, estavam ali "por nada". O caso tornou-se conhecido e foi considerado um escândalo. Isto no início do século XX, porque só os homens tinham o direito de trair a mulher.

Maria Adelaide e uma companheira decidiram fugir. Apesar de ser muito difícil, conseguiram, graças à ajuda de Manuel Claro. Esta fuga deu-se no dia 3 de Fevereiro de 1919. Depois de ter fugido duas vezes de Alfredo da Cunha, Maria Adelaide pensava que ele a deixaria em paz e nunca mais a ia procurar, mas enganou-se!

Foi para o Rossão, uma aldeia onde vivia a família de Manuel, passando ali uns dias maravilhosos. Todos gostavam dela, mas, no dia 15 de Fevereiro, encontraram-na e levaram-na para o Conde de Ferreira , " a sua dor era ainda maior do que da primeira vez, quando à luz do sol, vira projectar-se a sombra de Alfredo da Cunha, percebeu que o seu internamento tinha o sabor acre da vingança".

Volta ao Conde de Ferreira, onde os dias eram todos iguais. Passados dois meses de internamento, o seu filho vai visitá-la para lhe dar a notícia de que iria para o estrangeiro para ser tratada, mas ela não aceitou, pois isso seria abandonar a sua pátria.

Manuel foi preso, pois foi acusado de ter raptado Maria Adelaide. A injustiça continuava a dar sinais de vida…

Levaram-na a uns médicos: Júlio de Matos, pouco simpático, baixo e deselegante, cabelos brancos, ar severo, voz seca e áspera, trai a mulher; Egas Moniz, cabelo preto e muito penteado, é um homem com quem se simpatiza; Sobral Cid, um rapaz de boas figuras, dos três foi o mais simpático, ambiciona subir na vida. Estes três "sábios de Lisboa" fizeram-lhe várias perguntas às quais ela respondeu com lucidez…

Mas a necessidade de confirmarem a loucura de Maria Adelaide era de tal maneira precisa que foram analisar geneticamente os seus antepassados, foram "mexer no pó dos cemitérios". Tudo o que encontraram de doenças nos seus antepassados era sinónimo de loucura, como a diabetes, entre outras… Diagnóstico de Maria Adelaide, "loucura-lucida"… Pois até para se estar louca "é necessário que antepassados tenham sofrido do coração".

Tudo foi feito para que ela fosse dada como louca, pois dizia muitas vezes que estava ali por vingança e não para tratamento. A loucura foi a explicação do crime de amor que cometeu, "antes a julguem louca que desonrada". Todos lhe viraram as costas, pois se tivesse trocado "o meu marido por um conde ou um duque iriam perceber, mas por um homem de classe muito inferior já todos me viram as costas".

Ela considerava o manicómio um autêntico inferno: "cada hora ali passada equivale a um mês de vida que se perde, a comida era horrível, ali devia de haver um viveiro de fanecas fritas e bifes feitos de sola".

No dia 9 de Agosto de 1919, Maria Adelaide foi chamada ao gabinete do director. Sentiu um choque enorme, pois quando a chamavam para lá ir, era para ser vista por médicos alienistas, para mais uma vez confirmarem a sua loucura, porque os que a consideravam louca foram pagos por Alfredo da Cunha para tal.

Mas não!! Desta vez tudo foi diferente. Era o Governador Civil e o seu advogado Bernardo Lucas para lhe darem a boa notícia de que iria ser libertada.

Maria Adelaide, nesse momento, ficou doida, sim, mas de alegria, pois o momento que tanto esperava aconteceu. Nessa tarde, saiu do manicómio e foi para casa de Bernardo Lucas, onde foi muito bem recebida e onde passou a noite num bonito quarto com uma boa cama. Nessa noite, uma sombra lhe turvou a felicidade: Manuel, que estava preso e o seu filho que nunca chorou por ela: " saudades e dores num dia repleto de alegrias inexprimíveis".

A notícia de que Maria Adelaide tinha saído do manicómio espalhou-se rapidamente, o que o seu filho comentou:" uma pobre alienada à solta". Sendo assim, Maria Adelaide já não estava segura em casa de Bernardo Lucas e foram para a Póvoa de Varzim, uma pequena terra de pescadores, onde, pensavam eles, nunca os encontrariam. Na segunda noite na Póvoa, receberam um bilhete para partirem no primeiro comboio que houvesse. Voltaram para casa do advogado, e Maria Adelaide fugiu, não revela para onde," pois nem todas as verdades se dizem".

A polícia de investigação do Porto procura-a por todo o lado. Tinha instruções para a prender e levar de novo para o Conde de Ferreira. Maria Adelaide andava a monte. Vivia da caridade das pessoas amigas, que nunca revela quem são.

Manuel Claro sai da prisão a 28 de Janeiro de 1922 e, à sua espera, tinha Maria Adelaide: Foram viver juntos, numa casa muito modesta, húmida, fria e sem conforto. Manuel torna-se taxista e Maria Adelaide costureira. O casal passava dificuldades. Manuel tinha família muito bem sucedida, no Brasil, que convidou Manuel para ir para lá trabalhar, mas como Maria Adelaide não podia, ele não foi. Se alguma dúvida ainda pudesse restar sobre o amor entre ambos, ficava desfeita. Maria Adelaide afirmou que " recebi do Manuel o respeito e o carinho que Alfredo nunca me deu".

A 21 de Dezembro de 1942 morre Alfredo da Cunha. Seu filho estava desolado e tenta encontrar sua mãe. Descobriu onde ela estava e quis estar com ela. Estava, agora, com 70 anos e a relação deles reatou-se.

Maria Adelaide morreu em 1954 com 84 anos.

Célia Fonseca



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